terça-feira, 17 de maio de 2011

As algemas de Strauss-Kahn - Manuel Queiroz

Em quantos países do mundo se veria a foto de um dos homens mais poderosos algemado e com as mãos atrás das costas?

1. Em quantos países do mundo ocidental o director-geral do FMI seria incomodado quando já estava instalado na primeira classe do avião? Em quantos países do mundo se acreditaria imediatamente na história de uma simples empregada negra de um hotel? Em quantos países do mundo ocidental se veria essa imagem, evidentemente chocante, de Dominque Strauss-Kahn, um dos homens mais poderosos do mundo, algemado, com as mãos atrás das costas, ladeado por polícias da esquadra do Harlem? (Faça zoom nas páginas 18 e 19).

Quando a vi ontem de manhã pareceu-me a imagem de uma condenação sem juiz que os polícias americanos encenaram para ter efeito; depois de DSK ter sido mantido preso pela juíza que o ouviu sumariamente, é provavelmente a condenação de um ancião a quem demasiadas vezes perdoaram demasiadas coisas. Um homem que fez um grande trabalho à frente do FMI desde 2007, mas que não pode deixar de ser responsabilizado se, de facto, cometeu um crime com a gravidade daquele de que é acusado.

E a sua condição de homem mundano não pode ser, a confirmar-se a acusação, senão uma agravante. Estamos a falar de um crime, não da simples sedução de uma mulher por parte de um homem, por poderoso que seja.

O sistema judicial americano tem muito de cinema e são conhecidas as formas como os district attorneys atacam as suas vítimas, bem como a forma como muitas vezes preferem um mau acordo a um pleito incerto. É um outro sistema, mas na Europa dificilmente teríamos esta imagem de um homem de poder como DSK algemado. A presunção de inocência sobrepõe-se ao resto e sobretudo o alto perfil de um acusado é sempre defendido. Isto não acontece com delinquentes que são apenas delinquentes. No entanto, aquela foto de DSK é sobretudo um requiem de toda a sua carreira. Acabou, mesmo com presunção de inocência incluída. Isto parece terrível porque ele nega todas as acusações. Só que na política conta também o histórico, e esse é só por si uma sentença sem absolvição possível para Dominique Strauss-Kahn.

2. Os ministros das Finanças europeus aprovaram ontem por unanimidade, como era requerido, o pacto de ajuda a Portugal. É o início de um processo e não o fim. A partir de agora, Portugal contrai obrigações com a Comissão Europeia, o Banco Central Europeu e o Fundo Monetário Internacional, que vão obrigar a fazer escolhas e a aplicar as medidas que foram definidas. É um programa extenso, duro, complicado - creio que o primeiro- -ministro José Sócrates prestou um mau serviço ao país ao apresentá-lo como algo com um aspecto fácil. Pode ter sido um bom serviço eleitoral ao PS, mas foi um mau serviço ao país, porque vai ser preciso que toda a gente esteja muito centrada no cumprimento daquilo que fica definido preto no branco. Claro que se percebe que há uma campanha eleitoral em curso, mas hoje não se pode brincar com estas coisas. Com todas as trapalhadas, prefiro ouvir Passos Coelho dizer que vai apostar na maior transformação económica do país. Porque ou conseguimos fazer mesmo uma transformação acelerada do país a todos os níveis, ou continuamos a andar na cauda da Europa porque este caminho por onde temos andado não é mesmo o caminho. O PS tem feito uma campanha a defender o que existe e sabe que muito do que temos não pode existir daqui a três anos.

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