quinta-feira, 26 de outubro de 2017

Quero cumprir as 35 horas na escola e não faço mais nada em casa. Nada, zero, rien, nadica de nada!!!

A propósito da profissão docente e tendo em conta a realidade vivida no dia-a-dia, reproduzo aqui um artigo do Alexandre Henriques do ComRegras, com o qual concordo inteiramente. Espero que sirva para esclarecer a realidade da profissão docente e não continuem a ser tidos como uns "malandros" que trabalham pouco e têm muitas férias.


Compreendo que os critérios editoriais são o que são, compreendo que um bom título é meio caminho andado para boas audiências, mas de 3 páginas de índice da Análise Sectorial do Docente – 2014/2015, tinha logo que estar escarrapachado na 1ª página do público que mais de metade dos professores tem horário reduzido

Como dizia o outro… não havia necessidade

E é pena porque:

100% dos jornalistas não passam o tempo todo a escrever notícias ou a fazer reportagens;

100% dos médicos não passam o tempo todo a fazer cirurgias ou a atender pacientes;

100% dos juízes não passam o tempo todo em julgamentos;

100% dos bancários não passam o tempo todo a atender clientes;

100% dos polícias não passam o tempo todo a fazer rondas;

Já perceberam onde quero chegar, certo?

Tal como os professores, todas as profissões têm um tempo “letivo” e outro “não letivo”, e não quer com isto dizer que o tempo não letivo seja menos importante que o tempo letivo. Aliás, o “letivo” só pode existir com o mínimo de sucesso graças a toda uma preparação feita nos bastidores. Estando os professores envelhecidos, é natural que haja mais professores com menos aulas, é uma consequência legal mas isto não significa que trabalhem menos. Além disso, a notícia esquece-se dos milhares de professores do 1º ciclo e pré-escolar que não têm nenhuma redução da componente letiva e esses que eu saiba também são professores.

E pelos vistos a DGEEC considerou o desporto escolar como tempo não letivo, mas no horário dos professores de Educação Física este encontra-se na sua componente letiva (afinal como ficamos?) e só quem nunca deu desporto escolar é que pode achar que dar um treino é diferente de dar uma aula. Se calhar no desporto escolar não estão lá alunos, tenho que lhes perguntar o que são…

Esta ideia peregrina que de lés a lés é deitada cá para fora que os professores trabalham pouco e têm muitas férias é uma mentira que teima em ser repetida. Recomendo a leitura do meu artigo “A Verdade Sobre as Férias dos Professores

Pois bem, vamos acabar com as insinuações, as suposições, as bocas e as maledicências…

Os professores passam a cumprir o seu horário integral na escola. Isso mesmo, as 35 horas ali, dentro dos portões das escolas. Acham que havia muitos professores a recusar? Era já o primeiro a aceitar e sabem por quê?

Não mexia uma palha em casa, nada, zero, rien, nadica de nada, fazia as minhas 7 horinhas diárias na escola, até picava o ponto se fosse preciso e parava tudo. Tinha mais tempo para a mulher, para a criança, tinha fins de semana a 100%, tinha mais tempo para escrever, para ler, para ir passear o cão etc…

E mais, também aceito o fim da burocracia e transformamos a componente de estabelecimento em horário letivo. Onde é que posso assinar?

Porque é que o Ministério de Educação não incentiva esta ideia? Porque eles sabem tão bem como nós que as escolas não têm condições para agregar dezenas de professores em horário não letivo/individual e também sabem que a grande maioria dos professores ultrapassa as suas 35 horas semanais, e já agora também sabem que muito professor utiliza material do seu bolso (portáteis, folhas, impressoras, eletricidade, canetas, etc…) que multiplicado por mais de 100 mil era capaz de fazer mossa no orçamento de estado…

Já estou mesmo a ver os testes a serem entregues passado 3 meses, chegarmos às aulas sem nada preparado, não recebermos pais depois das horas de expediente e dizermos aos alunos “olha, eu sei que estás com problemas mas já piquei o ponto, fica para amanhã pode ser?”.

Vá, vamos… querem os professores ao minuto? Vamos então ser professores ao minuto!!!

As escolas só funcionam por muito amor à camisola, por muita carolice e por muita responsabilidade dos seus docentes e já agora não docentes. Esta é a realidade e a sociedade em geral, onde a comunicação social está também incluída devia ter um pouco mais de consideração e respeito para com os seus professores. Quando se fala na desvalorização da classe, o que se passou ontem foi apenas mais um exemplo…

quarta-feira, 25 de outubro de 2017

Os Recursos do Prof-Folio: Khan Academy (Em Português)



A plataforma Khan Academy em português integra cerca de 12.500 exercícios práticos interativos e mais de 1.000 vídeos de Matemática do ensino básico. Promove uma aprendizagem lúdica e personalizada, pois à medida que cada aluno evolui ao seu ritmo próprio vai ganhando pontos e medalhas! Lançada em fevereiro de 2017, a plataforma conta já com 15.000 utilizadores e 2,3 milhões de minutos de utilização.

Pode ser utilizada por professores, alunos e pais permite incentivar os alunos a aprender de forma divertida e ao seu ritmo. permite resolver exercícios em cada uma das matérias, apresentando dicas e videos que ajudam à sua resolução.

É possível verificar os conhecimentos, tendo acesso a relatórios de progresso que também identificam dificuldades por temática.

Os professsores podem criar turmas para, momento a momento, acompanharem e monitorizarem a evolução de cada aluno, tendo acesso às suas maiores dificuldades, podendo a qualquer momento fazer sugestões de actuação relativamente a cada uma das matérias.

Também os pais poderão acompanhar os progressos feitos pelos seus filhos.

Adaptado de: Blog de ArLindo

terça-feira, 24 de outubro de 2017

Novo Portal "A Educação em Exame"



A informação é uma das bases para o conhecimento e para os processos de tomada de decisão. No universo da educação também. É verdade também que os discursos e as politicas em educação são também contaminados por visões diferenciadas da sociedade e da educação, as famosas questões "ideológicas", e os dados são muitas vezes “torturados” para que digam o que convém ou o que "queremos" que digam.

No entanto e apesar de tudo, embora já existam muitas bases de dados Disponíveis regista-se a existência de um novo portal, “A Educação em Exame”, da responsabilidade da Fundação Francisco Manuel dos Santos, em parceria com o Conselho Nacional de Educação e o com Expresso.


O portal permite o acesso a um enorme volume de dados no âmbito das várias edições do PISA (Programme for International Student Assessment), quer em termos nacionais, quer em termos comparativos com os restantes países envolvidos.

sexta-feira, 20 de outubro de 2017

Regiões em Números 2015/2016 (DGEEC)

Nos últimos dez anos vimos diminuir o número de alunos, o número de docentes, o número de estabelecimentos de ensino, as taxas de retenção e desistência, o rácio alunos com computador e o rácio aluno com computado com internet.

Vimos aumentar a taxa de escolarização em quase todos os domínios.


A DGEEC disponibilizou a publicação “Regiões em Números 2015/2016”, composta por 5 volumes – Norte, Centro, Área Metropolitana de Lisboa, Alentejo e Algarve. Poderá encontrar informação estatística oficial, desagregada por NUTS e municípios, referente às diferentes ofertas de educação e formação, compreendendo a educação pré-escolar e os ensinos básico e secundário:

  • Regiões em Números 2015/2016 – Retrato Geral [XLSX] [ODS]
  • Regiões em Números 2015/2016 – Região Norte [PDF] [XLSX] [ODS]
  • Regiões em Números 2015/2016 – Região Centro [PDF] [XLSX] [ODS]
  • Regiões em Números 2015/2016 – Região Área Metropolitana de Lisboa [PDF] [XLSX] [ODS]
  • Regiões em Números 2015/2016 – Região Alentejo [PDF] [XLSX] [ODS]
  • Regiões em Números 2015/2016 – Região Algarve [PDF] [XLSX] [ODS

quarta-feira, 18 de outubro de 2017

Lágrimas Nacionais


Meu querido senhor, não o conheço mas atrevo-me a escrever-lhe estas palavras tão sentidas quanto esse olhar que a todos nos abraça! Choro ao escrever-lhe, sabia? Porque vejo nesse olhar um vazio total de esperança, a esperança que um dia, com o vosso suor, todos vocês, que trabalharam desde que começaram a andar, ofereceram às gerações vindouras, as mesmas gerações que hoje vos tratam como lixo! Choro, choro muito, porque sei quão isolados e abandonados vocês vivem, como se fossem lixo que envergonha os engravatados que nunca trabalharam seriamente na vida! Choro, porque sei que muitos de vós morrem entre suspiros de lamentos e gritos de socorro, sem que nenhum de nós vos tente sequer ouvir! Choro, porque o que hoje ficou queimado não foi apenas os lares simples que vos protegiam da chuva, o que hoje ficou a descoberto foi o horror social em que milhões de vocês, no Interior, vivem diariamente! Choro, porque sei que muitos de vós jamais tiveram um dia de férias, cultivando solos debaixo de sol, chuva e até granizo, tratando de animais que nos alimentavam no dia a dia, tratando da Terra como quem trata de um filho, a mesma Terra que hoje vos utiliza para gritar ao mundo que está com pena do que vos aconteceu! Como é possível não chorar perante a ternura de um olhar vazio de vida!? Como é possível não chorar perante a simplicidade de uma camisa suja que deveria cobrir de vergonha quem se apresenta de gravata e em viaturas que custam mais do que a construção de uma casa? Como português que nasceu nos tempos "modernos", que usa e abusa dos luxos construídos com o dinheiro do vosso suor, não posso deixar de, a chorar, vos pedir perdão! Desculpem! Perdoem-nos por todo o mal que vos estamos a fazer! Desculpem a nossa apatia perante tudo isto! Perdão! Mil vezes vezes perdão! Um país justo e de pessoas de bem jamais vos abandonaria à vossa sorte! Poderia aqui dizer que vossemecês deveriam ser mais pró-activos, mas isso seria não ter vergolha alguma perante quem trabalhou uma vida inteira e, de idade já avançada, merecia muito mais que respeito, merecia consideração, dedicação e paixão. Desculpe-me meu rico senhor, em meu nome, em nome de um país que amo porque vocês mo fizeram amar, mas não este país que nos querem impingir, um país sem valores, sem respeito e sem amor por quem tanto deu à pátria de todos nós. Perdão meu rico senhor! Como eu gostaria de o conhecer, abraçar e ouvir, e dar um pouco de mim para o confortar. Que a vida nos junte, é o meu desejo.

Soube agora que o Sr. Francisco faz hoje 82 anos.
Do fundo do coração, em nome do meio milhão de pessoas que hoje segue a página Aldeias de Portugal:
PARABÉNS SR. FRANCISCO.

Texto: Paulo Costa (Retirado do Facebook - Aldeias de Portugal)
Foto: Adriano Miranda - Jornal Público

terça-feira, 17 de outubro de 2017

Ainda os incêndios! Outra vez os incêndios...


Quando os responsáveis se preparavam para encerrar a época oficial dos fogos, eis que a conjugação da habitual mão criminosa ou negligente com os factores de risco máximo de incêndio – mais de 30º de temperatura, menos de 30% de humidade relativa, ventos a mais de 30km/h – varreu novamente o país de labaredas.

A crescente gravidade destes fenómenos, que não encontra paralelo em qualquer outro país europeu, deveria levar a repensar seriamente as estruturas e o modelo que ao longo destes anos foi criado para a prevenção e combate aos incêndios e a protecção das populações vítimas dos fogos.

Além dos terrenos florestais e agrícolas, das casas e dos automóveis ardidos, o último balanço, quando escrevo estas linhas, vai já em 41 mortos e cerca de 60 feridos. Isto é intolerável. Até quando terá de continuar a morrer gente, para que se perceba que não podemos deixar que estas tragédias, como parecia sugerir ontem o primeiro-ministro, passem a fazer parte do novo normal?

De facto, a protecção civil cresceu em cargos, responsabilidades e dinheiro para gastar. Houve jobs for the boys e também para gente experiente e competente. As câmaras viram as suas competências acrescidas a este nível, profissionalizaram-se bombeiros, investiu-se na formação, fizeram-se contratos milionários em torno de meios aéreos e outros equipamentos dispendiosos de combate ao fogo e num caprichoso sistema de comunicação de emergência que nas horas críticas deixa de funcionar. Mas o que se constata é que tudo isto falha clamorosamente de cada vez que temos um verão mais seco e prolongado.

Não se pede a quem coordena todas estas coisas que faça milagres, e sabemos que algumas situações extremas serão, pela sua natureza, incontroláveis. Contudo, o que se passou ontem nalgumas estradas portuguesas, por exemplo, parece demonstrar que se aprendeu muito pouco com o incêndio de Pedrógão.

Só por sorte não houve ontem à noite, no IP3, uma catástrofe ainda pior do que a de há quatro meses, quando vários automóveis e autocarros cheios de passageiros ficaram cercados pelas chamas.


A juntar a tudo isto, há declarações de governantes que são minimamente infelizes e que demonstram o desnorte completo e incompetência dos mesmos para lidar com estes tipo de situações.

É urgente que haja responsabilidades políticas! Depois deste ano, o combate aos incêndios e a proteção e ordenamento da floresta têm que tomar outro rumo, sob pena de voltar a suceder o esquecimento do assunto após a época de incêndios.

Impotentes perante o fogo, acabamos todos a pedir que chova!

Adaptado de: Escola Portuguesa

sexta-feira, 13 de outubro de 2017

A mercantilização da Educação: o dinheiro não fala às Humanidades

A cada novo ano letivo é o vigor democrático que é questionado, ao ser posta em causa uma educação plena para a cidadania.

Carlos Alves

A educação liberal visa proporcionar um conjunto de competências intelectuais e práticas, instigadoras do desenvolvimento do pensamento analítico crítico, competências ao nível da escrita e oralidade, enquadramento das matérias em contextos históricos e multiculturais, valorizando a autonomia e capacidade de trabalhar em equipa, desempenhar papéis cívicos e aplicação do conhecimento na resolução de problemas num mundo em mudança, no qual tem uma atitude valorizadora do papel da cidadania. Ou seja, competências transversais a todas as profissões.

Trump foi, recentemente, a voz mais audível de um notório ressentimento cultural que desvaloriza as áreas do conhecimento, tradicionalmente identificadas como essenciais numa educação liberal em simultâneo a uma ascensão da ideologia STEM (science, technology, engineering, math). Esta falsa obrigatoriedade de escolha instiga os governos a subfinanciar as humanidades e ciências sociais favorecendo as áreas associadas à ciência, tecnologia, engenharias e matemática ou áreas profissionais.

Nas escolas portuguesas, a cada início de um novo ano letivo, deparamo-nos com as turmas de Ciências e Economia assoberbadas com alunos motivados pela ideia de saídas profissionais mais facilitadas, publicitada pelo pensamento tecnocrático e neoliberal do money talks, centrado no PIB, que alastrou à educação.

Paralelamente, o curso de Línguas e Humanidades e o de Científico-Humanísticos de Artes Visuais perdem importância e reconhecimento. Nesta mercantilização da educação insuflada por rankings com guerra de matrículas entre as escolas mais bem posicionadas, o dinheiro não fala às humanidades, reféns da valorização económica, cada vez mais definidas como pouco vantajosas, alastrando a incompreensão da sua utilidade e relevância, ante políticas educativas, da ciência e da cultura servis ao utilitarismo neoliberal.

As consequências deste downsize a que estão votadas as humanidades estão espelhadas na carga horária das disciplinas abrangidas por estas nas nossas escolas. A avidez pelos cursos de Ciências e Tecnologias e Ciências Socioeconómicas faz com que, possibilitada pela autonomia das escolas, haja uma transferência de recursos para estas áreas, nomeadamente na distribuição de tempos letivos por disciplina. Assim, a nível nacional regista-se na carga horária da matriz curricular do 2.º ciclo do ensino básico a atribuição de um mínimo de 250 minutos semanais às disciplinas de Português e Matemática individualmente, a mesma carga horária que Inglês e História e Geografia de Portugal partilham entre si. A Educação Artística e Tecnológica (Educação Visual, Educação Musical e Educação Tecnológica) conta com 270 minutos, ficando a distribuição ao critério da escola, sendo que obrigatoriamente 90 minutos são para Educação Visual, podendo verificar-se o caso de apenas 45 minutos estarem disponíveis para Educação Musical no 5.º ano.

O ensino artístico sai, assim, penalizado. Para um professor de música ter um horário completo necessita de um número exagerado de turmas e, face à escassez de tempos letivos disponibilizados, os objetivos educativos/pedagógicos são postos em causa.

Ao abrigo da sua autonomia e do seu regulamento interno, a escola pode definir disciplinas cujo resultado levará à retenção ou transição do aluno, independentemente do número de níveis inferiores a três. Como exemplo, um aluno com nível 2 a Português e Matemática poderá reprovar se a escola assim o definir, ao passo que outro aluno, na mesma turma, com nível 2 a Português e Inglês transitará de ano. Essa mesma autonomia permite a criação de critérios específicos que definem a integração ou não do aluno num Quadro de Honra ou Mérito (prática comum nas escolas), espelhando uma discriminação de disciplinas em detrimento de outras, em que se regista o fato de a Matemática sair exageradamente valorizada e ser elemento impeditivo para a integração se o aluno tiver nível 3 (e não negativa!) a Matemática, mesmo que tenha obtido nível 5 a todas as outras disciplinas. A situação insólita (e existente) incentiva uma cultura baseada na convicção de que há disciplinas mais importantes do que outras, para além do embaraço indefensável de dar azo a casos em que alunos com média elevada ficam excluídos do Quadro de Honra relativamente a alunos com nível 4 a Matemática (mas média inferior aos primeiros), bastando aos primeiros ter um nível 3 na disciplina de Matemática para se verem arredados dessa possibilidade de integração. A média é, assim, preterida com base na valorização excessiva de uma disciplina.

A carga horária da matriz curricular do 3.º ciclo do ensino básico prevê um total mínimo de 200 minutos quer para Matemática quer para Português, atribuindo às disciplinas de Línguas Estrangeiras em conjunto 270 minutos e a Geografia e História 200 minutos no 7.º e 8.º anos e 250 no 9.º ano.

Penalizado continua o ensino das artes em geral, deixando de existir Educação Musical no 3.º ciclo e contando a área de Expressões e Tecnologias (TIC, Educação Visual, oferta de escola e Educação Física) com um total de 300 minutos no 7.º e 8.º anos e 250 no 9.º ano.

No panorama citado salvaguarda-se nesta análise o caso do Português (disciplina obrigatória em todos os cursos até ao 12.º ano), cuja carga horária sofre, porém, um decréscimo no ensino secundário.

As lacunas das escolas ao nível das línguas e aprendizagem da música são supridas, com sacrifício familiar, pelo recurso a institutos e escolas de línguas e a escolas de música e conservatórios regionais.

Esta sobrevalorização tem contribuído, ainda, para alimentar o comércio paralelo e sinuoso das explicações (com especial ênfase para a Matemática) que ajudam a ultrapassar o calvário dos testes sobredimensionados das escolas e dos exames (à data de redação deste artigo discute-se um exame único de Matemática) associados aos cursos mais procurados pelos alunos, nomeadamente Medicina, Gestão, Informática, Economia. Com todos estes custos acrescidos suportados pelas famílias, derivados destas opções, é a própria noção de gratuitidade do ensino que fica posta em causa.

Por outro lado, a desvalorização das humanidades tem como corolário a diminuição do seu peso relativo, conduzindo esta situação à redução do número de graduados e a um decréscimo do financiamento público direcionado para estas, fruto da dificuldade de justificação da pertinência das investigações face à perda de preponderância.

A eliminação de departamentos universitários, decréscimo de salários, diminuição de recursos destinados a bibliotecas, alteração de práticas de comunicação específicas e a aplicação de modelos de avaliação da atividade científica desadequados relativamente à especificidade das Humanidades são também consequências visíveis.

Autores como Martha C. Nussbaum alertam, ainda, para esta desvalorização de que resulta o menosprezo das qualidades cidadãs imprescindíveis para a democracia em si. Em Cultivating Humanity: A Classical Defense of Reform in Liberal Education (1997) argumenta que o propósito da educação liberal é cultivar a humanidade, ou seja, educar para a cidadania, e em Not For Profit: Why Democracy Needs the Humanities (2010) denuncia a “crise silenciosa” a que as nações estão votadas ao desvalorizarem competências necessárias para a vitalidade democrática, provenientes das humanidades, em virtude da sua “sede pelo lucro nacional”.

Em Portugal, a “aposta” em disciplinas como Educação para a Cidadania e Debate e Argumentação (por vezes com um tempo letivo semanal) funciona como um paliativo ou remendo para o desinvestimento na História, Geografia, Filosofia, Literatura, formadoras de cidadãos conscientes, críticos e participativos essenciais para a democracia.

A cada novo ano letivo é o vigor democrático que é questionado, ao ser posta em causa uma educação plena para a cidadania, possibilitada pelo estudo das humanidades, que proporcione aos alunos o exercício do pensamento crítico, estimule a coragem e a vontade de examinar, refletir, discutir, argumentar sem indulgências pela autoridade ou tradição, a empatia pelo outro e de conceber os desígnios nacionais como constitutivos de uma realidade global.

É por isso que a memorização das artes e humanidades é um luxo só para milionários.


Fonte: Público

quinta-feira, 12 de outubro de 2017

As ferramentas do Prof-Folio: Analisador Morfológico

Trazemos hoje aqui, uma ferramenta que poderá ser útil em várias circunstâncias: Um analisador morfológico online.

Aceda aqui: WebJspell

domingo, 8 de outubro de 2017

Dos resultados das Provas de Aferição (2)


Os resultados, aparentemente desastrosos, das provas de aferição – chegou a haver, nalguns parâmetros aferidos, percentagens superiores a 80% de alunos que não conseguiram fazer o que lhes era pedido – estão a suscitar diferentes reacções da parte dos diversos intervenientes e interessados nestas coisas. Interessa ver é se bate a bota com a perdigota, ou seja, se aquilo que dizem é o resultado de uma análise e reflexão serena, com base nos resultados e nas condicionantes destas provas, ou é apenas o engatilhar de um discurso que já estava preparado para o efeito.

Comecemos pelo ME, onde o secretário de Estado João Costa se confessa preocupado com o facto de tão grande número de alunos não estar a aprender “com qualidade”, desfiando em seguida o rol de medidas que pretende implementar. E que são, regra geral, mais do mesmo:

Segundo João Costa, a Português será feito um estudo do impacto dos projetos dirigidos ao desenvolvimento da leitura e da escrita nos 2.º e 8.º ano, com o alargamento da formação de professores do 1.º ciclo, com a atualização e a reedição dos materiais produzidos pelo Programa Nacional do Ensino do Português.

No domínio da Matemática, adiantou, e para os 2.º e 5º anos, o Ministério vai acompanhar as escolas com desempenhos mais frágeis, alargar a formação de professores do 1.º ciclo, criar uma equipa de acompanhamento do currículo nesta área específica e atualizar e reeditar materiais de apoio.

O Ministério da Educação assume uma aposta na formação de professores uma vez que esta é, em todos os anos de escolaridade em análise, uma das respostas apresentadas para combater as fragilidades assim como a elaboração de materiais em colaboração com universidades e escolas superiores.

Esta formação, explicou o secretário de Estado da Educação, será em formato de oficinas com uma grande componente prática.

Em matéria de expressões artísticas, no 2.º ano de escolaridade, o secretário de Estado anunciou a expansão do Programa de Educação Estética e Artística (DGE-PEEA), nomeadamente na sua vertente de formação docente na área da educação artística, assim como o desenvolvimento de projetos de parceria entre o Ministério da Educação e o Ministério da Cultura, tais como o alargamento do projeto-piloto “Residências Artísticas”.

No que se refere à História e Geografia de Portugal no 5º ano, os resultados das provas revelam a necessidade de monitorizar as aprendizagens essenciais, e no que se refere às Ciências Naturais no 5.º ano e Ciências Naturais e Físico-Química do 8.º ano o Ministério da Educação anuncia o reinvestimento no ensino experimental, nomeadamente através dos Clubes Ciência Viva.

Do lado dos representantes dos pais, a Confap insiste numa linha que também já não é nova: rejeitam a escola “do autocarro” e querem mudanças que façam sentido numa “escola do século XXI”, um slogan tão sedutor quanto vazio de sentido. Ainda assim, as palavras destes pais, que querem uma “revolução” no sistema educativo, merecem reflexão mais atenta e demorada, pelo que provavelmente se justificará voltar a elas um dia destes…

“Estes resultados mostram que o atual modelo de ensino é feito para os alunos memorizarem, fazer o teste e esquecer, e por isso tem de ser repensado. Isto não tem que ver com a escola em si, mas com a cultura instalada na sociedade, em que a escola é apenas vista como um meio de acesso ao ensino superior, quando deve ser um instrumento para o desenvolvimento dos jovens para a cidadania e para o pensamento crítico”, disse ao CM Jorge Ascenção, presidente da Confap, que tem defendido uma maior separação entre ensino secundário e superior, com as universidades e politécnicos a definirem por si os critérios de acesso.

O responsável da Confap afirma que “o modelo do autocarro na sala de aula, com todos a olhar para as costas dos colegas, já não faz sentido”. “Para quem nasce na era digital e trabalha muito à-vontade com computadores, este modelo não está adequado. É preciso um trabalho diferente, mudar este modelo e colocar nas crianças o gosto pela descoberta. Há muito que pregamos sozinhos sobre isto”, disse o responsável, defendendo ainda uma mudança feita “com calma, serenidade e com todos os intervenientes”.

Quanto aos professores, as reacções são variadas e reflectem uma visão que, ao contrário do olhar exterior dos pais e dos académicos, dirigentes e burocratas ministeriais, foca sobretudo o contexto em que estas provas surgiram e foram aplicadas:

  • Tendo em conta que os resultados estão muito abaixo dos habitualmente obtidos, quer em provas nacionais de final de ciclo, quer em testes internacionais, nenhuma análise séria pode ser feita se não se questionar, previamente, a própria concepção e elaboração das provas, que provavelmente não avaliam correctamente o que era suposto avaliarem;
  • Os níveis de exigência estavam desajustados em relação à idade dos alunos e aos anos de escolaridade em que se aplicaram as provas, sobretudo no caso do 2º ano, onde ainda pouco há para aferir;
  • Passou-se a ideia de que estas provas “não contam para nada”, o que terá levado, sobretudo entre os alunos mais velhos, a que houvesse pouco empenhamento na realização dos exercícios propostos, sobretudo quando implicavam a produção de texto ou a elaboração de raciocínios mais complexos;
  • Os melhores resultados obtidos na área das expressões do 1º ciclo, onde se esperavam maiores dificuldades, tendo em conta as falhas que têm sido reportadas nesta área, sugerem que o conhecimento prévio do que iria ser avaliado contribuiu para a melhoria de resultados.

Depois de ter acabado com os exames no 1º e no 2º ciclo, este ministério necessitava de uma avaliação nacional que pudesse fazer o ponto da situação relativamente à qualidade das aprendizagens dos alunos do ensino básico, que surgiu com as provas de aferição realizadas em 2017. E aqui, a obtenção de resultados que só não são catastróficos porque não têm consequências para os alunos pode vir dar um novo alento às mudanças curriculares que o governo pretende introduzir, mas que estão longe de despertar entusiasmo entre a maior parte das escolas e dos professores.

Estaremos assim a assistir a um clássico que já vimos com outros governos: trata-se de inculcar a ideia de que isto está pior do que a gente pensava, e de que só com as sábias medidas que o governo irá implementar – e com provas substancialmente mais fáceis daqui por um ano ou dois – será possível colocar os alunos portugueses na senda das aprendizagens de qualidade exigíveis na escola do século XXI.

Afinal de contas, sabemos há muito tempo que quando os alunos melhoram as suas aprendizagens isso se deve às iniciativas dos ministros. Já quando não aprendem a culpa é, invariavelmente, dos professores


sábado, 7 de outubro de 2017

Quando não estou em aula...


Olho para os dossiers de Direção de Turma dos meus colegas. Estão todos direitinhos, organizadinhos, bonitinhos, arrumadinhos… O meu está em branco, só com os separadores… Tenho uma data de papéis soltos dentro de uma capa à espera de serem arquivados… Atrevo-me a comentar a minha situação e as colegas, porreirinhas, tranquilizam-me: - “Com tempo, Dalila, isto é aos poucos!” -, enquanto arquivam mais uns documentos nos já volumosos dossiers que são os delas…

Vou dar uma espreitadela aos meus mails. Já recebi 97 na minha caixa de correio institucional iniciada a 8 de setembro… Foram rápidos a criá-la. A escola é até bastante eficaz com essas coisas. Não me posso queixar. Disponibilizam tudo. Têm tudo organizado, esquematizado, prontinho para ser usado. E não deixam dúvidas. É assim e pronto. Gosto que seja assim. O que não falta por aí são coordenadores ou diretores que são ambíguos, não esclarecem, contradizem-se, e na hora em que as coisas correm mal, somos nós que não soubemos “interpretar” ou então fomos mesmo incompetentes…

Os meus colegas são prestáveis e parecem-me todos muito cumpridores e profissionais. Isso é bom, é ótimo, mas deixa-me ainda mais nervosa. Era tão bom poder culpar alguém por andar à nora! Não… Já todos me enviaram vários documentos… regimentos (tudo tem um regimento), papéis relacionados com as tutorias, com as necessidades educativas especiais, com a equipa para a prevenção da indisciplina, testes diagnósticos, plano anual de atividades… Ontem, andaram em trocas de mails sobre o PAA. Será que também queriam a minha opinião? Não consegui arranjar tempo para me debruçar sobre aquilo…
Ai, as siglas! Na nossa profissão, gostam todos muito de siglas e de acrónimos… Consegui perceber alguns: aqueles que também se usam nas outras escolas. Tenho apontado os outros para pesquisar depois… Já repararam que quase todos têm um P? Depois… Faço isso depois… Há coisas mais urgentes para já!

Ao meu lado, uma colega que está nas duas escolas do agrupamento. Agora tem de ir para a terceira escola que ela conseguiu para completar o horário. Tem tudo calculado, esquematizado, programado. Não pode falhar nem distrair-se um pouco. “Tem de ser!”, diz ela.

Tenho que me encontrar com a professora de Educação Especial para falar dos vários casos da minha Direção de Turma. Apontar as alíneas. Tenho que apontar as alíneas e enviar isso aos meus colegas do Conselho de Turma.

Logo, tenho reunião para perceber o funcionamento da Equipa para a Prevenção da Indisciplina. Não me posso esquecer!

Deixa-me ver se não tenho mais alunos para as tutorias. Pediram-me para confirmar isso, já me esquecia…

Deixa-me ir ao cacifo buscar o meu bloco de notas para ver o que me falta. Deram-me a chave ontem. Tenho um cacifo! Há anos que não tinha! Espera, qual é a chave? É esta! Sim, é esta! E agora, qual é o cacifo? Não me lembro do número… Apontei-o mas está lá no bloco de notas dentro do cacifo… Bolas… Vejo depois…

Tenho que pedir os manuais às editoras. Faço isso por mail mais logo. Até é rápido… Mas tantas coisas rápidas juntas e passa-se o dia… Ainda bem que as minhas colegas me emprestaram os delas enquanto chegam e não…

Deixa-me ver se está muita gente na secretaria. Não. Boa! Vou aproveitar e ver o que se passa com as horas de Direção de Turma que ainda não tenho no sistema para sumariar. Ah! Chegou o cartão da escola. Aproveita também para o levantar, Dalila…

“A tua Gabriela voltou a dar-me uma resposta torta!”, diz-me uma colega quando saio da secretaria. A “minha” Gabriela… Pois, são meus… Vão ser os meus João, António, Manel, Francisco… As minhas Ana, Sofia, Teresa… A “minha” Gabriela… Caramba, não me recordo de nenhuma Gabriela! Qual delas é? Sorrio. “Eu vou falar com ela!”, acabo eu por dizer. “Não, não vale a pena! Era só pra saberes!”…

Falando em maus comportamentos, tenho que redigir as participações dos miúdos do CEF. Aquelas aulas com eles dão cabo de mim! Ainda tenho que fazer fichas para eles para a aula de amanhã… Não me posso esquecer que a reprografia está fechada na hora do almoço. Tenho que arranjar maneira de as fotocopiar de manhã no intervalo. Pode ser que não haja muita gente ou estou tramada…

“Dalila, já conheceste a colega Maria? Ela andava à tua procura. É a DT dos miúdos a quem dás TT (Olha, este acrónimo não tem “P”!) e como costuma ser uma disciplina dada pelo DT, ela queria falar contigo para se organizarem em conjunto!”. O colega que me aborda é super prestável. Já me ajudou com pequenas coisas várias vezes. Quero dizer o nome dele, mas não me lembro… Bolas… Ele sabe o meu nome e eu não sei ainda o dele… Bolas… Limito-me a sorrir “Não, não conheci ainda…”. E ele continua “Eu já lhe disse quem tu eras, quando ela chegar à sala dos professores, apresento-vos!” E eu quero dizer “Obrigada, João ou Manel ou Pedro ou Alziro”, mas fico-me pelo “Obrigada!” sem me conseguir lembrar do nome…

Está na hora da minha aula. Corro os vários cacifos com a chave até encontrar o meu. Retiro de lá os testes diagnósticos e corro para a sala. Separo os alunos e começo a distribuir as folhas. Ai, não é este! É o outro! Recolho as folhas e distribuo o teste adequado. Que figurinha a minha! Foca-te, Dalila! Concentra-te!

Já na sala dos professores, conheço a Maria e falamos do tal TT da sua DT. Uma outra colega vem ter comigo. Quero tomar um cafezinho, mas acho que não vou conseguir. “Tu é que és a Dalila? Eu sou a mãe da Rita da tua Direção de Turma!” Quem é a Rita? Oh, valha-me Deus! Sorri! Sorri, Dalila… Ai, não, o assunto é sério. Pára de sorrir! Foca-te! Concentra-te! Ouve! Esquece o café!

De volta aos meus mails, leio os assuntos antes de abrir. Tanta oferta formativa. Devia ler isto com atenção, mas não tenho tempo. Tantas ofertas de atividades para os alunos. Também devia ler isto com calma, já que tenho Direção de Turma… Mas… Prioridades, Dalila! Abro tudo aquilo que está relacionado com a DT. É tanta coisa que até me assusta, mas acabo por me sentir amparada. Está aqui tudo… Abro um documento “Calendário para realização de embelezamento da escola”. Fico perplexa. A medo, pergunto à minha colega no computador ao lado “Desculpa, que documento é este? Sabes?”. Muito simpática, responde-me “Temos que marcar uma vez por mês, acho eu, no Tempo Turma uma hora para cuidar da escola. Pode ser apanhar lixo, decorar uma sala, coisas assim…”. Fecho a boca para a abrir de novo, desta vez com um sorriso “É uma iniciativa muito louvável!”, acabo eu por dizer, antes de voltar a fixar o meu ecrã… Por instantes, apetece-me bater com a cabeça na parede, mas há mais pessoal na sala e acabo por conseguir conter-me…

Tenho que agendar a minha primeira reunião com os Encarregados de Educação… Ainda não tenho dossier, mas tenho que tratar disso… Não posso deixar arrastar. Mais uma vez, tenho ordem de trabalhos já pronta para essa reunião. Boa! Vou ver para redigir a convocatória. Com tantas coisas para fazer, é bom que esteja tudo assim: mecanizado. É só fazer e pronto! Há um ponto que é "Tomada de conhecimento dos documentos referidos na alínea q) do artº 7º da Lei nº 51/2012 de 5 de setembro"… Que é isto? Ah! Regulamento Interno, Estatuto do Aluno… Claro, claro…

Na hora de TT, trato da eleição do delegado e do subdelegado de turma. “Professora, estávamos a pensar fazer a nossa viagem de finalistas em Espanha. A escola dá-nos autorização para sairmos do país?” Respondo que vou perguntar, e só penso “Mas a viagem de finalistas também tem a ver com a escola?” e tremo só com a pergunta…

Quando chegar a casa, tenho que enviar os conteúdos dados na minha disciplina à DT daquele miúdo que tem faltado… E tenho que fazer a ata da eleição do delegado… E as fichas de CEF…. Se sobrar tempo, preparo a aula para o 9.º e a do 8.º… Se não sobrar tempo, abro os livros e sigo as instruções dadas pelas editoras sobre os passos da aula… As editoras também são super organizadas hoje em dia…Está tudo mecanizado! Felizmente… Sim, felizmente… É mecanizar tudo para se ser eficaz… Assim, consigo fazer as coisas… 

Consigo, sim… Mecanizar! Mecanizar!... Alguém me explica este sabor a ferro que me incomoda apesar de tudo?

Texto de Dalila Ribeiro publicado em Professores Lusos

sexta-feira, 6 de outubro de 2017

Dos resultados das Provas de Aferição



Já foram divulgados os resultados das provas de aferição e os resultados são preocupantes em todas as áreas avaliadas à excepção das Expressões Artísticas e Motoras. O Ministério já divulgou um conjunto de medidas a desenvolver destacando a promoção da formação de professores.

Como já aqui tenho escrito continuo com muitas dúvidas sobre a realização das provas de aferição em anos intermédios dos ciclos, 2º. 5º e 8º. Uma aferição, creio, deverá ser realizada no final de um período de aprendizagem. Só nessa altura será possível “aferir” os resultados que se encontram face aos resultados que se esperam e ter uma visão global comparativa.

Uma avaliação durante um período de trabalho com o objectivo de detectar dificuldades e corrigir trajectórias é evidentemente um requisito de qualidade mas é, do meu ponto de vista, uma avaliação de diagnóstico, de regulação, não de aferição. Assim deveremos olhar para estes resultados não esquecendo a sua eventual contaminação pela representação que os discursos sobre as provas de aferição podem ter provocado nos alunos e famílias no sentido da sua desvalorização.

Os alunos que agora responderam às provas de aferição serão avaliados no PISA de 2018, 2021 e 2024 e passaram globalmente pelo efeito das metas curriculares e da examocracia desde 2011 e 2012. Veremos se conseguimos manter a trajectória de sucesso no PISA que vinha a registar-se até 2015.

Quanto aos resultados e à sua melhoria o ME identifica a Formação de professores como eixo central.

Sabemos que apesar do peso das variáveis relativas aos alunos e contexto social, económico e cultural, o trabalho na e da escola e dos professores é um factor significativamente explicativo do sucesso dos alunos mais vulneráveis e capaz de contrariar ou minimizar o peso dessas variáveis.

Este trabalho da e na escola envolve dimensões como organização e funcionamento, clima, níveis de colaboração e cooperação, estilo e competência das lideranças, por exemplo e, definitivamente, o trabalho em sala de aula em que surge a diferença produzida pelo professor, pelos professores.

Quando abordo estas questões cito com frequência uma afirmação de 2000 do Council for Exceptional Children, "O factor individual mais contributivo para a qualidade da educação é a existência de um professor qualificado e empenhado". Neste quadro a formação é sempre importante mas será que é a principal fragilidade?

Terá a generalidade das escolas recursos (tempo, docentes e técnicos) e autonomia para organizar dispositivos de correcção de trajectórias escolares de insucesso ou em risco detectadas nestas provas de aferição?

Também sabemos que o sucesso se constrói identificando e prevenindo dificuldades de forma precoce, com a definição de currículos adequados, com a estruturação de dispositivos de apoio eficazes, competentes e suficientes a alunos e professores, com a definição de políticas educativas que sustentem um quadro normativo simples e coerente e modelos adequados e reais de autonomia, organização e funcionamento das escolas, com a definição de objectivos de curto e médio prazo, com a valorização do trabalho dos professores, com práticas de diferenciação e expectativas positivas face ao trabalho e face aos alunos, com melhores níveis de trabalho cooperativo e tutorial, quer para professores quer para alunos, etc.

Sabemos tudo isto. Nada é novo.

Só falta um pequeno passo.

Construir para todos os miúdos trajectórias de sucesso. Não, não é uma utopia. Tal como o insucesso não é uma fatalidade do destino.

quarta-feira, 4 de outubro de 2017

Resultados nacionais das provas de aferição (2016/2017)

Foi hoje disponibilizado um documento com os resultados das provas de aferição e respetiva análise, tendo por base as provas realizadas no ano letivo 2016/2017.
O Ministério da Educação deu também a conhecer uma série de medidas que pretende implementar/desenvolver.

terça-feira, 3 de outubro de 2017

À consideração dos professores do meu país

“Quando eu tinha cinco anos, a minha mãe dizia-me que a felicidade era a chave da vida. Quando fui para a escola, perguntaram-me o que queria ser quando fosse grande. Escrevi feliz. Então eles disseram-me que eu não tinha entendido o exercício. E eu disse-lhes que eles não entendiam a vida.”
John Lennon 


Santana Castilho

Como qualquer humano explicado por Freud, somos o resultado da disputa entre o nosso “id”, vertente primária subjugada pelo instinto, o nosso “ego”, bússola de navegação pela realidade externa, e o nosso “superego”, o árbitro implacável que vigia e obriga os outros dois estádios a permanecerem entre os limites da moral vigente e a considerar os seus dilemas.

Poderemos falar de um “superego pedagógico”, que obrigue os que têm por missão orientar os seres em crescimento a não lhes dar o que não lhes deve ser dado, mesmo que imposto pelos normativos modernistas dos que mandam, prolongando a abulia e subjugando as vontades? Deverá esse “superego” atípico impedir que os professores empurrem as crianças pelos corredores da pressa e do utilitarismo, quando as deviam guiar pelos trilhos calmos do personalismo e dar-lhes tempo para terem tempo? Trilhos onde os livros tradicionais ganhem aos meios electrónicos, a memória seja uma qualidade intelectual respeitada e o silêncio cultivado como meio para nos encontrarmos connosco próprios, aprendendo que até um cabelo projecta a sua sombra.


A missão de um professor é também impulsionar e acelerar a evolução da humanidade dos seus alunos, tornando-os mais sensíveis, ensinando-os a distinguir a verdade da mentira, a justiça da injustiça, a humildade da vaidade, a bondade da inveja. O desiderato de um professor é também ter alunos que prefiram uma derrota com honra a uma vitória com trapaça, que escolham a gentileza à brutalidade, que prefiram ouvir a gritar, que saibam que chorar é próprio de quem sofre, não diminui e, quando acontece, só engrandece. A obrigação de um professor é também ensinar aos seus alunos que só aquece aquilo que se consome, que a falta de uma só trave pode tombar todo um sistema, que é mais difícil fazer o que o coração dita que o que os outros esperam, que é impossível tocar uma nuvem mantendo os pés no chão, que são os erros e as esperanças desfeitas que ajudam a crescer e que, citando Confúcio, “não poderão mudar o vento mas poderão ajustar as velas do barco para chegarem onde quiserem”.


Na Escola não vivemos ao Deus-dará. Vivemos ao Governo-dará, em situação de permanente experiência, conforme o lado donde sopra o vento, sem ponderar impactos, sem avaliar as políticas ou com avaliações pré-ordenadas para que os resultados sejam os pré-decididos. Na Escola permitimos que as teorias sobre a formação de “capital humano” capturem as teorias sobre o funcionamento da educação integral, expulsando as artes e as humanidades. Na Escola vivemos obrigados por leis verga-carácter, constantemente alteradas e interpretadas segundo a conveniência do legislador, esquecendo o dever que nos assiste: não calar! E calamos. E desistimos. E pactuamos. Pactuamos com insanos que se julgam profetas e tomam decisões em nosso nome.


Eu sei que a complacência produz amigos e a franqueza pode gerar ódios. Mas exponho-me, com o que sinto. Se queremos resolver e não apenas discutir os problemas da nossa profissão, temos que começar por tomar consciência de que fomos convertidos em proletários mal pagos, ao serviço de senhores que não têm que fazer prova nem de saber, nem de coerência, muito menos de ética, para mandar. Quando a nossa indignação for maior que o nosso medo, então sim, discutiremos razões em vezes de colocações. E viveremos, como os outros portugueses, sem pânico de nos desmembrarem a família em cada ano que começa.


Aldous Huxley escreveu algures que a ditadura perfeita teria a aparência da democracia. Que seria um sistema de escravatura onde os escravos teriam amor à sua escravidão. No início deste ano escolar, abraço os professores do meu país e ouso sugerir-lhes que pensem no que acabo de escrever.


Fonte: Público

domingo, 1 de outubro de 2017

O novo(?) perfil do docente

Sem novidades o novo Perfil do Professor, publicado pela DGEEC, construído a partir dos dados estatísticos mais recentes, que se referem ao ano lectivo 2015/16.


De facto, não tendo havido, nos últimos anos, qualquer alteração significativa ao modelo de concursos, carreira ou grupos de recrutamento, apenas se pode esperar, deste novo estudo sobre os docentes portugueses, que confirme e reforce as tendências que já anteriormente se evidenciavam.

Ficamos assim a saber que existiam, em 2015/16, no ensino não superior 142 913 professores, dos quais 122 452 no ensino público. Bem menos do que os cerca de 180 mil que chegaram a existir dez anos antes. Ainda assim, os valores apurados são ligeiramente superiores aos números reais de docentes em exercício efectivo nas escolas, pois incluem, por exemplo, situações em que um professor em baixa médica é substituído temporariamente por um colega, sendo, para efeitos estatísticos, contabilizados ambos os docentes.

Os professores portugueses distribuem-se, por níveis e ciclos de ensino, da seguinte forma:



Uma questão que continua a ser pertinente é a do envelhecimento da classe docente, que rapidamente se constata ao verificar que a idade média dos professores oscila entre os 45 e os 49 anos nos diferentes níveis de ensino. Olhando para a forma como os docentes se distribuem por diversas faixas etárias, percebe-se que cerca de 80% da classe é constituída por docentes que ingressaram na profissão no final dos anos 70 e ao longo da década de 8o, um período em que o alargamento da escolarização e uma natalidade superior à actual obrigaram à contratação de muitos professores. Posteriormente, a estabilização do sistema e a redução da natalidade reduziram bastante a procura de novos profissionais e as medidas austeritárias dos últimos dez anos fecharam a escola pública à entrada de jovens professores.



O desequilíbrio da estrutura etária na profissão docente é evidente e, sem que sejam tomadas medidas políticas para o contrariar, tenderá a aumentar nos próximos anos. Ainda assim, a sua incidência apresenta, numa análise mais pormenorizada, aspectos que vale a pena destacar.

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