“A morte é muito provavelmente a melhor invenção da vida”, afirmou Steve
Jobs, em 2005, frente a uma plateia de estudantes da Universidade de
Stanford, nos EUA. “Lembrar-me de que todos estaremos mortos em breve é a
ferramenta mais importante que encontrei para me ajudar a fazer as
grandes escolhas na vida”.
O icónico fundador da Apple morreu ontem, 5
de Outubro, com 56 anos, um dia depois de ter sido apresentado o novo iPhone 4S, depois de anos com vários problemas de saúde
relacionados com um tipo raro de cancro do pâncreas.
A Apple perdeu um génio visionário e criativo e o mundo perdeu um líder e mestre, ser humano fantástico!
Todos perdemos...
A importância da caligrafia
Frequentemente descrito como um empresário brilhante e um inventor
visionário (tem o nome em mais de 300 patentes), é um exemplo do
conceito americano de self made man.
Steven Paul Jobs
nasceu a 24 de Fevereiro de 1955, em São Francisco, na Califórnia. Tanto
o pai (um sírio a estudar ciência política) como a mãe (uma
universitária americana) acharam que eram muito novos para o criar. Foi
adoptado por um casal de classe média que morava em Mountain View,
também na Califórnia – a zona que anos mais tarde viria a ser Silicon
Valley, a meca da tecnologia a nível mundial.
Durante a
adolescência de Jobs, várias empresas de tecnologia tinham instalações
naquela área e ele cresceu num ambiente que acompanhava o despontar da
electrónica pessoal.
Quando andava no liceu, em Cupertino (onde
hoje é a sede da Apple), frequentava conferências nocturnas na
Hewllet-Packard e chegou a trabalhar lá durante um Verão. Foi onde
conheceu o funcionário da HP Steve Wozniak, um geek com talento para montar placas de circuitos e com quem viria a fundar a Apple.
Entrou
para a Universidade de Reed, mas só esteve inscrito um semestre. O
curso era demasiado caro para a bolsa dos pais. E Jobs “não tinha ideia
do que fazer com a vida”, lembrou no discurso em Stanford.
Apesar de ter desistido do curso, continuou pelo campus.
Dormia no chão no quarto de amigos e recolhia garrafas de cola para
receber o dinheiro do depósito e comprar comida. Uma vez por semana,
tinha “uma refeição decente” num templo hindu. E resolveu frequentar
aulas de caligrafia, porque achava que os cartazes da faculdade (feitos à
mão) eram bonitos. Nestas aulas, aprendeu princípios estéticos que
marcaram não só a história dos produtos da Apple, mas também de todos os
computadores pessoais.
O princípio da Apple
O primeiro computador Apple era basicamente uma placa de circuitos que
tinha de ser montada pelos compradores. Foi lançado em 1976, custava
666,66 dólares e tinha sido desenvolvido por Jobs e Wozniak, na garagem
dos pais de Jobs.
A empresa foi oficialmente fundada no ano ano seguinte. Em finais de
1980, avançou para uma triunfal entrada em bolsa. Jobs (então com 25
anos), Wozniak (cinco anos mais velho) e largas dezenas de outros
investidores iniciais tornaram-se milionários instantâneos.
Com a empresa a crescer, o jovem
empresário aliciou o então presidente da Pepsi, John Sculley (um
executivo experiente) para o cargo de CEO. Segundo o mito, Jobs terá
perguntado a Sculley se este queria passar o resto da vida a fazer água
com açúcar ou se queria ajudar a mudar o mundo.
A Jobs coube
então a tarefa de chefiar a divisão dos Macintosh, uma das gamas de
computadores que a marca desenvolvia. Mas a relação entre Sculley e Jobs
deteriorou-se e, na sequência de uma luta interna de poder, acabou por
ser afastado da empresa que criara. Tinha 30 anos, era multi-milionário,
solteiro, sentia (admitiu mais tarde) que falhara e não sabia o que
fazer a seguir.
Fora da Apple
Após meses de reflexão, decidiu fundar uma nova empresa de computadores,
chamada NeXT, que desenvolveu computadores topo de gama destinados aos
mercados universitário e empresarial.
Um ano depois, em 1986,
comprou o The Graphics Group à produtora Lucasfilm, de George Lucas. A
empresa desenvolveu um computador destinado a sectores que precisassem
de trabalhar com gráficos exigentes, como o cinema e a medicina. Mas o
produto não foi bem sucedido e o The Graphics Group acabou por evoluir
para a Pixar, o estúdio de animação que criou Toy Story, lançado em 1995
e que é o primeiro filme de animação com gráficos gerados por
computador. Jobs surge na ficha técnica do filme como produtor
executivo.
Mais tarde, em 2006, a Disney acabou por comprar a
Pixar, tornando Steve Jobs no maior accionista individual daquela
empresa, com cerca de sete por cento das acções.
Foi também
durante o período fora da Apple que Jobs conheceu a mulher, Laurene
Powell. Casaram-se em 1991, numa cerimónia dirigida por um monge budista
(a religião de Jobs). Ele tinha 36 anos, ela era sete ou oito anos mais
nova.
O casal tem um filho e duas filhas. Ele já fora pai em
1978. Na altura, começou por negar a paternidade da criança (alegando
que era estéril), mas acabou por reconhecê-la e um dos primeiros
computadores da Apple chamava-se Lisa, o nome desta primeira filha. Na
versão oficial, porém, o nome do computador é a sigla de Local Integrated Software Architecture.
O segundo acto
Steve Jobs, foi o protagonista de um dos maiores
segundos actos da indústria tecnológica dos EUA.
Em 1996, a Apple
decidiu comprar a NeXT, que tinha pouco sucesso comercial, mas
desenvolvera tecnologia importante, a qual acabou por ser responsável
por um grande salto evolutivo nos computadores da Apple.
A
aquisição fez Jobs regressar à empresa que fundara. Primeiro como
conselheiro e, logo em 1997, como CEO interino, cargo que acabou por
assumir definitivamente três anos depois.
Na altura, a Apple estava em dificuldades financeiras. Jobs decidiu
acabar com uma série de projectos falhados e lançou uma nova linha de
computadores Mac. Eram computadores, disse então, cuja parte de trás
tinha melhor aspecto do que a parte da frente dos concorrentes. Sob a
sua liderança, a empresa regressou aos lucros.Já neste século, resolve
dar um novo novo rumo à Apple.
Rodeado da equipa de executivos que agora
lidera a empresa, faz uma incursão no mundo da música: em 2001, a Apple
lança o primeiro iPod, que praticamente se veio a tornar sinónimo de
leitor de música. Dois anos mais tarde, volta a abalar o sector musical,
ao lançar a loja online iTunes: em vez de ser preciso comprar álbuns
inteiros, as pessoas podiam agora comprar apenas as canções que
quisessem.
Em 2007, já visivelmente debilitado (apesar de o cancro pancreático que
aparecera três anos antes ter sido descrito como curado) volta a levar a
Apple por um novo caminho, com o lançamento do iPhone. Há anos que a
indústria dos telemóveis procurava um modelo com um ecrã sensível ao
toque que apelasse aos consumidores. Mas foi preciso o toque de Jobs
para que surgisse a fórmula certa.
Com o iPhone, Jobs virou o
sector ao contrário. Vários fabricantes apressaram-se a tentar seguir as
pisadas da Apple. A Nokia, na altura um portento dos telemóveis, está
em declínio, em grande parte porque ainda não conseguiu encontrar forma
de competir neste novo mercado.
Dois anos mais tarde, recebeu um
transplante de fígado, altura em que teve uma ausência prolongada da
liderança da empresa. Em Janeiro de 2011, voltou a uma baixa médica, por
motivos de saúde não especificados. Já não regressou. Em finais de
Agosto, demitiu-se.
“Sempre disse que no dia em que não
conseguisse cumprir com os meus deveres e responder às expectativas como
CEO da Apple, seria o primeiro a dar-vos conhecimento disso.
Infelizmente esse dia chegou”, escreveu na carta de demissão, dirigida
ao conselho de administração e à “comunidade Apple”.
Contrariamente
a muitos gestores de topo, Steve Jobs tem uma legião de fãs, o que o
aproxima mais de uma estrela musical do que de um homem de negócios. A
seguir à demissão, surgiram em catadupa mensagens na Internet com
desejos de melhoras e declarações de admiração, mesmo da parte de alguns
críticos. Nos últimos anos, quando subia a um palco para apresentar um
produto, era sempre recebido com uma ovação. Fê-lo pela última vez em
Junho deste ano.
Adaptado de: Público
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