segunda-feira, 2 de setembro de 2013

O Bloco já não é bom como o milho


Expresso Online (02-09-2013)

Na última década e meia, o Bloco foi a gaja boa do pedaço, o mulherão mediático que toda a gente queria mimar com piropos, que clube tão sexy, sei lá. Esta confederação radical apresentava uma agenda de costumes que encaixava no ambiente de Lisboa e tinha figuras que passavam bem na TV. Louçã e demais vigários de cabeção vermelho eram bons marketeiros, quais metralhadoras de frases de efeito que faziam as delícias do repórter preguiçoso. Para sublinhar esta sensualidade política, recorde-se ainda que a agremiação tinha miúdas giras numa versão óbvia e felliniana (Joana Amaral Dias) e numa versão ínvia e timburtoniana (Ana Drago).

Entretanto, as coisas mudaram. A agenda fracturante esgotou o espaço da razoabilidade. Resultado? Os bloquistas têm de esticar a corda até ao absurdo, até ao humor involuntário. Por exemplo, já vi gente a namorar um "estudo científico" que garante que os gays são melhores pais do que os heterossexuais. Que estudo tão científico, tão progressista, tão sexy. Ora, a ideia de proibir legalmente os piropos encaixa como uma luva neste fim de linha simultaneamente cómico e totalitário. Sim, à primeira vista, isto parece piada. Proibir piropos? Se ouvir um pedreiro derramar um "és tão boa" sobre uma cidadã curvilínea, um polícia deve autuar o pedreiro de imediato? E o pedreiro loquaz paga a multa com multibanco? Mas debaixo deste humor involuntário encontramos algo mais sério: a velha pulsão totalitária dos comunismos que fundaram o Bloco, o desejo de controlar todos os aspectos da vida quotidiana, de padronizar todos os indivíduos segundo uma cartilha, de extirpar todas as pequenas imperfeições que não seguem essa cartilha.

Por outras palavras, o Bloco já não é bom como o milho. É uma velha com buço. Sem a agenda sexy, sem marketeiros e sem fellinianas, este partido ostenta um buço igualzinho ao do PCP. Sim, claro, é um buço muito progressista, muito de esquerda, sei lá, mas não deixa de ser um buço. E, buço por buço, prefiro o da Odete Santos.

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