A Crónica de Guilherme Duarte debruça-se esta semana na polémica gerada pelos subsídios atribuídos às artes e à cultura e que originou uma série de manifestações um pouco por todo país. Em nossa opinião, algumas posições têm toda a lógica, bem como algumas das propostas feitas.
Do outro lado, temos artistas que se queixam da reforma baixa e que precisam de dinheiro para pagar a renda, quando andaram a receber bem a vida toda, mas decidiram não declarar para descontarem o mínimo e não pouparam dinheiro porque são muito carpe diem e YOLO e assim. Estavam a contar, como grandes artistas que pensam ser, morrer cedo e não precisarem de usufruir da reforma. Temos pena. Descontassem e poupassem como as outras pessoas.
Dito isto, é óbvio que a cultura deve ser apoiada pelo Estado, isto se queremos ser um país desenvolvido. No entanto, apoiar a cultura não é dar milhões a realizadores que produzem filmes todos os anos que o público não quer ver; não é dar sacos de dinheiro a companhias de teatro que têm peças sem ninguém a assistir, durante anos a fio. Este movimento e manifestações da “Cultura acima de Zero!” deviam ter como foco um país mais culto e não artistas mais bem pagos e, infelizmente, pelo que ouvi de alguns, é pela segunda que estão motivados.
Apoiar a cultura é não é dar subsídios a artistas para que eles possam pagar a renda. Apoiar a cultura é, por exemplo, como foi feito em Itália, em 2016, em que todos os jovens que completassem 18 anos receberiam um bónus de 500€ que podia ser gasto em museus, teatros, cinemas, concertos, ou na compra de livros, música ou filmes. Isto é investir na cultura sem a desvirtuar e sem continuar a dar de mamar a pseudoartistas.
Apoiar a cultura é ter concursos públicos isentos (muito importante esta parte) onde qualquer pessoa pode submeter um projecto para financiamento, especialmente quem está a começar. Tens uma ideia e vontade de fazer um filme e não tens pais ricos? Se a ideia for boa e relevante para a cultura portuguesa o Estado deve ajudar, caso contrário a cultura fica monopolizada por gente de boas famílias que pode andar a brincar aos artistas sem se preocupar em pagar as contas, coisa que, pelo que vou vendo, acontece amiúde.
Apoiar a cultura é dar dinheiro para uso exclusivo na produção e não salários dos realizadores ou artistas que se juntaram para defecar em cima de jornais numa metáfora filosófica sobre o mundo. Se quiser ver cocó, vou passear a minha cadela. Apoiar a cultura é haver subsídios para usar em marketing e divulgação, por exemplo, para que as pessoas saibam que determinada peça, filme ou o que seja, existe. Assim, já ninguém se podia queixar que não tem público porque este desconhece a existência e apenas resta a hipótese de que ninguém os quer ver.
Apoiar a cultura é subsidiar associações culturais sem fins lucrativos que invistam nas artes para, entra outras coisas, dar um rumo e tirar miúdos em risco das ruas e do crime. Esse talvez seja o maior poder da arte e da cultura que muita gente descura: quando vês um rapper, por exemplo, a dizer que o hip hop lhe salvou a vida e que se não fosse por ele estaria preso ou morto; pena que o hip hop está para a música como o stand up comedy está para o teatro: são os parentes pobres, apesar de serem aqueles que mais vendem e geram visualizações. É curioso; embora a arte, por definição, não precise da validação do público, por isso é complicado julgar arte pelo que ela vende, já que todos sabemos, lá no fundo, que Jorge Palma é muito mais arte do que Maria Leal. Depois há a questão: o que é que é arte e cultura? Para mim, um quadro em branco não é arte nenhuma e dança contemporânea é tão criativa como ataques epilépticos, mas isto sou eu, é a minha opinião e o facto de a achar ridícula pode transformá-la em arte já que me está a despertar sentimentos.
“E se eu não quiser que os meus impostos vão para a cultura?”, perguntam alguns imbecis. E se eu não quiser que os meus impostos vão para pagar a educação e a saúde dos filhos de quem pergunta isso? Isto não são cá caprichos pessoais, damos todos para um bolo e o bolo é repartido por várias áreas, umas que nos agradam, outras não. Mas pronto, se os apoios do Estado para a cultura forem cada vez menores, resta aos artistas vender bilhetes e ter público. Sei que para alguns isso é aterrorizante porque sabem, lá no fundo, que ninguém os quer ver, ouvir ou ler. Talvez os queiram tocar, é investir nessa profissão.
Sugestões e dicas de vida completamente imparciais:
Uma série: Casa de Papel – 2ª temporada já está na Netflix
Um livro: O Caçador do Verão – de Hugo Gonçalves (não li, mas ele é meu amigo e tal, isto neste mundo já se sabe, é tudo cunhas)
Uma peça: Aquela que me falha o nome porque ninguém conhece, porque ninguém quer ver, porque não presta.
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