A Irlanda do Norte, que não tem um pingo de talento na equipa, consegue articular uma jogada com cabeça, tronco e membros e marca um golo na primeira parte, período durante o qual a Selecção Nacional se ausenta. Porquê?
Ninguém entende. Nem o seleccionador.
Estão reunidas todas as condições: Dragão cheio, um ambiente formidável, uma Selecção acarinhada e em 3.º lugar no ranking da FIFA, um Ronaldo centenário, um seleccionador ‘consensual’ (no ‘sistema’), prémios monetários assegurados e pagos, a estrutura do Euro-2012 intocada e as ‘forças vivas’ do País embrulhadas com a FPF num abraço solidário e estimulante.
Não havia mesmo razões para algo falhar, como às vezes existe.
Chove.
Olha-se para a equipa e o que se vê nela? Ausência de dois jogadores habitualmente titulares: Fábio Coentrão e Raul Meireles.
Um lateral esquerdo, que nem sequer é titular actualmente no Real Madrid e um médio, que nunca foi considerado um dos (três) ‘mosqueteiros’ da Selecção Nacional.
Confirmando uma tese que aqui desenvolvi antes da realização do ‘Europeu’, a Selecção Nacional faz uma boa equipa com o seu ‘onze’ titular disponível; quando entram ‘segundas linhas’ para certos lugares, a Selecção não consegue exibir os mesmos níveis de qualidade.
Quer dizer: não pode ‘chover’ na Selecção Nacional; se lhe faltam algumas unidades, ela ‘constipa-se’, ela desarticula-se, ela ressente-se, ela parece órfã (de qualquer coisa)...
Pieguice? Também um pouco, mas esta Selecção reflecte as assimetrias do nosso futebol: temos um bom grupo de elite, mas começam a escassear os grandes talentos ‘alternativos’...
... E, nestas circunstâncias, não se pode (não se deve) inventar: Miguel Lopes a lateral esquerdo? Rúben Micael a ’10’?
Postiga marcou um golo (um ponto), mas é claramente um ‘fetiche’ de Bento. O ‘fogo’ por Nélson Oliveira, subitamente, apagou-se.
Repito: temos um fora-de-série (ausente nos dois últimos jogos, porquê?), dois-três jogadores ‘plus’ de nível europeu (Nani, Pepe...) e os restantes oscilam de ‘forma’: se estão bem, a Selecção está bem; se estão mal, a Selecção ressente-se. João Pereira, Moutinho, Veloso, não têm estado bem na Selecção, e Nani anda apagado, provavelmente já deveria ter dado o lugar a outro...
Em síntese: facilitámos na Rússia e agora com a Irlanda do Norte. Jogámos estas partidas como se nada estivesse em jogo. E, agora, o costume: máquina de calcular...
Não muda nada. Há, no futebol português, uma tendência suicida que não acaba. O problema maior é que as coisas estão a ficar piores com o tempo, há menos jogadores de qualidade (empobrecimento qualitativo) e aí a FPF tem total responsabilidade: não tratou de salvaguardar o investimento continuado pela base e essa é a herança que Madail deixou. Andaram a condecorá-lo e agora não se queixem.
Um País pequeno não pode desaproveitar jogadores por causa de orgulhos, egos e teimosias. E, nos últimos tempos, os orgulhos, as retaliações, as arrogâncias, os egos e as teimosias têm ganho terreno, com o resultado de empobrecer a Selecção Nacional e o valor do futebol português.
Rui Santos
Fonte: Conversas da Bola
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